A partir de agora, até o fim do Pré-Olímpico, o Rebote fica de olho na seleção brasileira. Mas antes de entrar de cabeça no Pan, uma homenagem especial. Wlamir Marques, um dos nossos maiores jogadores de basquete em todos os tempos, completa hoje 70 anos. Fábio Balassiano bateu um papo com ele. Fiquem com o texto. E parabéns ao mestre.Por Fábio BalassianoExatamente hoje, dia 16 de julho, o futebol brasileiro lembra 57 anos da perda da Copa de 50. Nesta mesma data, em 1954, uma das maiores estrelas do basquete fez seu primeiro treino com a camisa da seleção nacional. Foi também num 16 de julho, em 1937, que nasceu um dos maiores jogadores da modalidade. Wlamir Marques (também conhecido como Diabo Loiro), que comemora o 70° aniversário ao lado da família em São Paulo, não nasceu numa data comum e vazia de coincidências. Tampouco foi um jogador dentro dos padrões aceitáveis.
Com 1,85m e uma velocidade assustadora para o que se via em território brazuca no começo da década de 50, Wlamir começou a despontar no time de sua cidade natal, São Vicente. Logo foi levado para Piracicaba, onde jogou pelo XV, antes de se transferir para o Corinthians. Foi pela seleção, porém, que, ao lado de uma geração fantástica (“sempre foi muito fácil jogar ao lado de Amaury, Rosa Branca, Ubiratan, Sucar, Paulista...”), ganhou um apelido de Alemãozinho do lendário técnico Kanela, além de inúmeras medalhas.

"Kanela foi um mito. Se não um inovador na parte tática, soube disciplinar uma geração de atletas novos e comandá-los com muita intensidade - tanto que brigava com o Algodão, seu atleta no Flamengo, a cada cinco minutos. A única coisa que não ganhei pela seleção foi reconhecimento. Aliás, se estes jovens que agora vestem a camisa amarela esperam isso, eles não vão ter. De todo modo, o que sempre quis foi jogar basquete, e isso eu consegui", reflete Wlamir, de sua casa em São Paulo, lembrando que mesmo com inúmeros problemas (ele chegou a fugir da concentração em Volta Redonda para ver o nascimento do primeiro filho às vésperas do Mundial-66), era um dos “queridinhos” de Kanela, que, após o primeiro treino com a seleção, encomendou um bolo e soprou velas com o pupilo.
Currículo invejável e derrotas dolorosasCestinha nos dois mundiais vencidos pela seleção brasileira (em 1959, no Chile, com 14.9 pontos, e em 1963, no Rio de Janeiro, com 18) e vice-campeão outras duas vezes, Wlamir ainda obteve um quarto lugar, um sexto (sua pior colocação pela seleção, em 1956, na Austrália) e dois bronzes em Olimpíadas (Roma-60, e Tóquio-64). As duas derrotas que impediram a medalha de prata não saem da cabeça do jogador, descrito pelo sisudo Kanela como “o mais genial dos alas do basquete mundial”.

"Apesar de termos sido campeões e vice mundiais em casa, perder duas vezes para a União Soviética nas semifinais dos Jogos Olímpicos foi duro demais. Sabíamos que derrotar os Estados Unidos seria muito difícil, mas, principalmente em Tóquio, fomos derrotados por um descuido da arbitragem. O Amaury me passou, estava livre, e o juiz marcou alguma coisa que até hoje não entendo", ressente-se, lembrando do time americano de 1960 treinado por Pete Newell, que contava com Jerry Lucas, Oscar Robertson e Jerry West (“um dos meus ídolos, com quem aprendi a fintar adversários”).
Momento glorioso em terreno doméstico
Contrariando o roteiro, a melhor partida da carreira de Wlamir Marques, que chegou a ser indicado ao Hall da Fama de Springfield em 1991 (“tinha que buscar muitos documentos, rapaz, e acabei desistindo disso”), veio com a camisa do Corinthians, em 1964. Bicampeão europeu e em turnê de amistosos pela América do Suil, o Real Madrid veio ao Parque São Jorge enfrentar o time de Amaury e Wlamir.

"Pouca gente sabe, mas acordei naquele dia com uma infecção no olho esquerdo. Minha esposa chamou o médico do clube, que me deu um remédio para poder jogar. Consegui, mas com um pouco de dificuldade. Marquei 51 pontos (31 no primeiro e 20 no segundo) e vencemos por 118-109. Foi a melhor partida da minha vida, principalmente pelo meu problema de visão", lembra o craque, que venceu oito títulos paulistas no Corinthians entre 1964 e 1971 e na época foi o maior ídolo da torcida. De acordo com o jornalista Juca Kfouri, “nos tempos em que o futebol do Corinthians não ganhava nada, Wlamir era tudo”.
Como coincidência pouca é bobagem, é também neste ano que Wlamir e sua maior companheira (Cecília) completam 50 anos de casamento. Foi também em 16 de julho que nasceu outro imortal do basquete brasileiro, o ala Rosa Branca. Crítico da maneira de atuar da seleção brasileira (“falta identidade, carga tática, mais personalidade e menos submissão por parte de técnicos e jogadores”), Wlamir Marques merecia homenagens por parte do basquete brasileiro - para ser justo, foi homenageado pelo COB na cerimônia de abertura do Pan-Americano. Por outro lado, cabe às novas gerações reverenciar aquele que, por 18 anos, defendeu a camisa do país e teve média de 16 pontos por jogo. Um pouco baixa essa pontuação, Wlamir?
"As duas únicas coisas que a minha geração não teve foram foto colorida e linha de três pontos. Se existisse, eu teria uma média bem superior. Acho que a distância é bem curta, aliás", diverte-se o Alemãozinho.
SELEÇÃO ESTRANGEIRA - Jerry Lucas, Oscar Robertson, Bill Russel (“quando estava no garrafão, a gente só conseguia infiltração quando ele estava distraído”), Jerry West e Michael Jordan. É este o quinteto de gringos escalados por Wlamir como os melhores de todos os tempos.
SELEÇÃO NACIONAL - Amaury, Oscar, Marquinhos, Rosa Branca e Ubiratan foram selecionados como os melhores brasileiros.
ALEMÃO NACIONAL - “Sempre gostei de velocidade e atrevimento. Foi a partir de mim e do Amaury que o basquete brasileiro começou a conhecer as enterradas e os lances mais plásticos. Quem hoje em dia assiste a Kobe Bryant e Allen Iverson pode ter uma idéia de como eu era em quadra”.